Impacto do turismo sobre os pescadores profissionais do São Francisco

Alexandre L. Godinho  
 

A riqueza dos recursos naturais e hídricos disponíveis na região do alto-médio São Francisco tem despertado, nos investidores privados e públicos, crescente interesse em firmar o turismo e o lazer como as grandes vocações econômicas da região.

Essa tendência chama a atenção para o fato que vêm sendo colocados em contato segmentos que vivem realidades sociais bastante diversas, o pescador profissional e o turista, convivendo e utilizando o mesmo espaço.
Com a modernidade, o tempo livre dos indivíduos tem sofrido grandes alterações, passando de momento dedicado ao descanso e entretenimento para transformar-se em mercadoria de consumo, tendência que exclui parcela significativa da população.

Ao contrário do homem urbano, o homem do interior ainda consegue manter hábitos que fogem a lógica do capital. Seu lazer depende do ritmo da natureza e não de agendamentos prévios e são voltados para descontração, reunião entre amigos, conversas, gratificação pessoal e ações de revalorização do trabalho, como comemorar a boa pescaria e não para o consumo.

O principal ponto de conflito entre as duas partes é quanto à responsabilidade pela degradação do rio. Quando um local passa a ser alvo do turismo, sobretudo com o apelo do uso das águas, é inevitável que, aos poucos, passe a ser objeto de exploração descontrolada e predatória. Para os turistas, diante da deterioração de um lugar bastará encontrar outro; mas para os habitantes do lugar restará conviver com os danos.

Os pescadores profissionais do São Francisco deparam-se, em virtude da expansão do turismo de lazer, com a ampliação da ameaça ao seu exercício profissional. Os pescadores amadores (muitos dos quais turistas) clamam pela retirada dos profissionais, alegando que a pesca artesanal estaria sendo predatória e ameaçadora à vida do rio. Além disso, a própria presença do pescador amador e do turista desemboca em ações governamentais que restringem mais ainda os locais onde se pode pescar, pois antes já existiam restrições quanto a reservas ambientais.

Um segundo ponto de conflito importante é a influência dos visitantes sobre os mais jovens, filhos de pescadores. Para os jovens, em seus momentos de lazer, é fundamental freqüentar os mesmos lugares freqüentados pelos turistas. Ao compararem o modo de vida mais atraente e promissor do turista, essa convivência tem, indiretamente, acentuado seu desinteresse em perpetuar a atividade pesqueira, sinônimo de vida difícil. O convívio com o turista reforça, no pescador profissional e em sua família, a necessidade de mudança nos seus costumes.

O fato de se apresentar como investimento lucrativo e de grande e diversificada demanda deixa pouca margem para que se façam críticas negativas em relação à exploração do turismo. Entretanto, se o lucro for pautado na fruição da natureza por grande número de pessoas, sabe-se que a atividade terá fim pelos danos ambientais decorrentes. Também se deve levar em conta que o pescador profissional poderá apresentar, dentro em breve, uma combinação de costumes que mudará sua relação com o lazer, substituindo, progressivamente, a participação nas festas comunitárias e familiares para uma vida consumista.

A sugestão principal deste estudo é que seja realizado desenvolvimento adequado do setor de turismo e lazer, considerando os hábitos tradicionais e o modo de vida dos moradores.

 


Texto adaptado de Felix, Silvana Aparecida. Impacto das atividades turísticas sobre a vida dos pescadores profissionais do São Francisco, p. 4488 - 458. In: Godinho, H.P. & Godinho, A.L. (ed). Águas, peixes e pescadores do São Francisco das Minas Gerais. Belo Horizonte: Editora PUC-Minas, 2003 por Lorena Galdino.

Publicado em  16 de agosto de 2007

frontpage hit counter