Co-gestão da pesca no vale do rio São Francisco
Alexandre L. Godinho |
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“Rumo a Co-Gestão da Pesca no Vale do Rio São Francisco” é um projeto
desenvolvido em 2004 e 2005 pelo Instituto Amazônico de Manejo dos
Recursos Ambientais (IARA) e pela Universidade Federal de São
Carlos (UFSCar), com recursos canadenses do Centro de Pesquisa em
Desenvolvimento Internacional (IDRC) e do projeto “Peixes, Pessoas e Água”. Quatro colônias de pescadores do rio
São Francisco, representando 430 famílias de seis municípios (Três
Marias, São Gonçalo do Abaeté, Pirapora, Buritizeiro, Barra do
Guaicuí-Várzea da Palma e Ibiaí), foram contempladas pelo projeto.
O objetivo do projeto foi transferir, via capacitação, as experiências de
co-gestão dos recursos pesqueiros no médio Amazonas visando
implementar acordos de pesca - Instrução Normativa 29 - colocar no rio São Francisco, segundo
as normas do IBAMA. Já no primeiro ano de atividade, uma série de
barreiras para a implementação de acordos de pesca, da forma como
aconteceu na Amazônia, foram identificadas. Entre elas,
sobressaíram as diferenças entre as duas regiões: na Amazônia os
acordos de pesca foram elaborados para sistemas mais fechados –
lagoas/lagos, enquanto que no rio São Francisco eles têm que ser
construídos para um sistema aberto. Na Amazônia, em torno dos
lagos, grupos de pescadores moram e trabalham, e entre eles
estabelecem-se relações comunitárias. No rio São Francisco, por
sua vez, os pescadores profissionais estão dispersos e, em algumas
localidades, eles estabelecem entre si relações individualistas,
societárias. Além disso, as relações com representantes do Estado
eram de desconfiança e de conflito.
Identificadas essas dificuldades, decidiu-se, em comum acordo com os
pescadores, centrar-se no desenvolvimento de oficinas que
contribuíssem para o fortalecimento das suas instituições e
comunidades sempre visando sua participação em processos de
co-gestão. As oficinas centraram-se em atividades de
desenvolvimento de disposições e conhecimentos mais afins com a
racionalidade urbana o que ampliaria suas condições de
participação em procedimentos de co-gestão.
Como resultados concretos, indicadores do “empoderamento” comunitário e do
desenvolvimento de condições favoráveis para um novo arranjo
institucional que possibilite a descentralização governamental do
manejo dos recursos pesqueiros e inserção de práticas e
conhecimentos ecológicos locais para um uso mais sustentável
destes, registram-se como exemplos:
1. Unificação das portarias de defeso do IEF e IBAMA;
2. Inclusão de instrumentos legais estadual para o manejo
participativo no Decreto Lei Estadual 38.744/97.
3. Incentivo à criação das Colônias de Pescadores de Ibiaí e
de Buritizeiro; 4. Aproximação entre os membros da categoria de pescadores
profissionais – “estamos mais unidos” – e as oportunidades
de troca de experiências entre eles em diversas atividades,
proporcionando o aprendizado entre os iguais. 5. Surgimento de novas lideranças, principalmente de mulheres. 6. Maior aproximação dos pescadores profissionais com órgãos
governamentais, empresas estatais, empresas privadas, pequenos e
médios proprietários de terra, escolas, universidades; e 7. Organização do Grupo de Trabalho da Pesca São Francisco (GTPesca)
com objetivo de ser o espaço privilegiado de discussão
inter-institucional para formação de novos arranjos que facilitem
a gestão compartilhada dos recursos naturais.
Considerável progresso foi alcançado no fortalecimento das organizações
comunitárias e suas expressões. Segundo os próprios pescadores e
representantes do Estado (Polícia Militar, IEF, IBAMA), as
relações, que antes eram de franco conflito, caminharam em direção
a uma relação de mais respeito mesmo quando conflituosa. Porém,
ainda é necessário maior desenvolvimento de instrumentos autônomos
de participação e representação dos pescadores para que as
mudanças alcançadas tragam retornos concretos e sustentáveis para
as suas comunidades e os recursos pesqueiros da região.
Além das atividades, deve ser ressaltada a experiência enquanto
construtora de conhecimento. De um lado, aprendemos a realizar
adaptações sociais e culturais em um processo de transferência de
tecnologia social; de outro, as próprias atividades propiciaram
espaço de observação para compreendermos melhor como diferentes
ordens sociais (diferentes padrões de desigualdade social –
associada a gênero, raça, escolaridade, diferentes tipos de
relações no interior dos grupos e entre esses e a sociedade mais
inclusiva) associam-se a diferentes níveis de desenvolvimento
econômico e a diferentes disposições de agir coletivamente.
Para saber mais
- IARA
e UFSCar, Projeto Rumo a Co-Gestão da Pesca no Vale do São
Francisco, 2003
Contribuição de Ana G. Thé
Publicado em 30 de
outubro de
2006 |